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Planejamento sustentável: qual o impacto da sua cooperativa?

Imagina transformar uma pastagem degradada, com solo frágil e pobre de nutrientes em uma área altamente produtiva, capaz de gerar renda para o produtor durante um ano inteiro e ainda reduzir as emissões de gases de efeito estufa? 

Pois foi isso que aconteceu na cidade de Maringá, no Paraná, onde os 200 cooperados da Cocamar  implementaram um inteligente sistema de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta. Entre os meses de outubro e fevereiro, eles cultivam soja e eucaliptos, em uma área que soma 210 hectares de terra — o equivalente a 247 campos de futebol. No inverno, o grão sai de cena e dá lugar à chamada brachiária, uma espécie de capim altamente nutritivo capaz de estruturar física e biologicamente o solo, servindo de alimento e pasto para o gado. 

Essa é uma importante tecnologia brasileira, possível de ser implementada em grande escala. Talvez seja o melhor que o Brasil tem hoje pra mostrar que é possível produzir e preservar ao mesmo tempo. Temos um orgulho enorme de estar nessa caminhada, com nossos cooperados, contribuindo para isso”, explica Renato Watanabe, gerente executivo da Cocamar, responsável pelo projeto.

Para ter uma ideia do impacto da metodologia, terras onde se produziam quatro arrobas de carne por hectare ao ano, passaram a gerar entre 45 e 50 sacos de soja e mais um pastejo de inverno com oito a nove arrobas por hectare ao ano. Resultado: um faturamento pelo menos dez vezes maior que o arrecadado antes da Integração Lavoura-Pecuária-Floresta.  

“Com resultados como esse, toda a comunidade sai ganhando. Tem mais compra de insumo, tem mais agrônomo dando assistência técnica. O produtor passa a ter dinheiro para gastar na comunidade”, comemora Watanabe.

Para completar, ao mesmo tempo que previne o esgotamento do solo, o novo sistema reduz a emissão de gases causadores do efeito estufa na atmosfera e garante renda aos cooperados durante todo o ano. Uma solução natural e sustentável, que só foi possível graças a um planejamento estratégico, com foco não só na rentabilidade da produção, mas também na sustentabilidade e no bem-estar do meio ambiente e da comunidade local.

ALTERNATIVA NATURAL

Renato Watanabe (Gerente Executivo Técnico) Sérgio Alves (Pesquisador IDR-PR)
Gerson Bortoli (Produtor ILP) e Alisson Nunes (Gerente Unidade de Umuarama)

Desde a implementação da Integração Lavoura-Pecuária-Floresta, 35% da soja da Cocamar passou a ser produzida em solos arenosos, típicos do noroeste do Pará. 

Criamos um modelo onde a gente não precisa mexer no solo", explica Renato Watanabe. "Fazemos a correção com bastante antecedência em superfície, e a soja entra para recuperar a parte química. Ou seja, melhorar a fertilidade e pagar os custos de correção de solo e adubação.”

Uma intervenção com essa só é possível com planejamento — um dos pilares fundamentais da boa governança. Isso exigiu que os gestores da Cocamar compreendessem a real situação dos cooperados, analisassem os riscos de não recuperar o solo e identificassem qual alternativa de recuperação de terras traria melhores resultados para o produtor e menos impactos para o meio ambiente. Resumindo: é o tipo de decisão que não se topa por impulso, exigindo uma acurada avaliação de cenário e  visão estratégica, ou seja, de médio e longo prazo.

Marco Moratto, coordenador de Meio Ambiente do Sistema OCB, explica que é esse elo entre a cooperativa e o cooperado, e o relacionamento direto com o consumidor, que possibilita o desenvolvimento de soluções e planejamentos voltados a atender critérios ESG. 

“Essa conexão permite que a cooperativa, através da governança que ela tem, criar por exemplo um setor, ou capacitar seus engenheiros e seus técnicos, para facilitar a adesão de tecnologias mais sustentáveis nas áreas produtivas”, afirma. “Mas o que nos facilita a sensibilização para esse tema é: a comunidade está exigindo. Toda a comunidade está voltando os olhos para processos, produtos e serviços mais sustentáveis”.


CASE INTERNACIONAL

O projeto de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta da Cocamar foi um dos cases levados pelo Sistema OCB à 27ª edição da Confederação das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP), que aconteceu em novembro passado, no Egito. 

Por conseguir aumentar naturalmente a produtividade do solo, comprovando que não é necessário devastar para produzir, essa tecnologia vem ganhando adeptos em todo o país. 

Vale destacar: a Empresa Brasileira de Pecuária e Abastecimento (Embrapa) estima que o modelo ILPF — que não é exclusivo da Cocamar — compreendeu 17 milhões de hectares, no Brasil, na safra 2020/2021. Esse tamanho pode ser expandido para 48 milhões de hectares, considerando principalmente as áreas improdutivas ou pastagens degradadas.


O primeiro passo do planejamento sustentável

Você alguma vez já se perguntou: qual é o impacto do meu negócio para a economia, para o meio ambiente e para a sociedade? Pois bem, saber responder a essa pergunta é fundamental para definir o que chamamos de materialidade — primeiro passo para desenvolver um planejamento estratégico de sustentabilidade na sua cooperativa.

Segundo a Global Reporting Initiative (GRI) — organização internacional independente que aconselha instituições públicas e privadas a entenderem melhor seu impacto socioambiental e econômico —, o passo a passo do processo de definição da materialidade de um negócio é relativamente simples: 

No caso do cooperativismo, a materialidade depende muito do ramo de atuação. Uma cooperativa que vende produtos cosméticos, por exemplo, vai ter como foco de impacto a utilização da água no seu processo de produção. Já uma cooperativa agropecuária, pode definir como um dos temas de materialidade a emissão de gás metano na atmosfera. E é essa definição que deve ser o ponto central no seu planejamento estratégico de sustentabilidade

Esse documento de sustentabilidade não está dizendo para o gestor ganhar menos dinheiro. Ela está dizendo: ‘Olha, você pode continuar ganhando dinheiro, mas tome cuidado para não destruir valores que estão ao seu redor’. Se você ganha muito dinheiro, mas destruiu valores sociais e ambientais, isso pode se voltar contra você”, alerta Glaucia Terreo, sócia-diretora da Walk4Good, empresa especializada em aconselhamento estratégico para gestão ESG. 

Térreo, que também já foi diretora da Global Reporting Initiative no Brasil, utiliza de um método bem didático para apresentar o que entende ser um bom planejamento estratégico de sustentabilidade.

Ela diz que há anos mostra a imagem de um iceberg. Onde o topo dele representa os resultados da organização, e a base três quesitos fundamentais que devem ser observados com atenção para manter a organização de pé: credibilidade, reputação e valor da marca. Esses três fatores, atrelados a aspectos como gestão holística de riscos, engajamento da sociedade e economia de recursos, associados ainda aos impactos em áreas como o meio ambiente, nos trabalhadores da organização e na comunidade.

Ou seja, na analogia do iceberg, se algo da parte de baixo é destruído, a parte de cima vai afundando também.

“O grande problema da insustentabilidade é o foco na parte de cima do iceberg, esquecendo que existe essa parte baixa. Tanto que quando a gente pega um relatório de gestão tradicional, você vai ver só números financeiros. E quando a gente fala de sustentabilidade, a gente fala de olhar o negócio como um todo”, explica Terreo.

AGENDA SUSTENTÁVEL

Para a líder da área de Sustentabilidade e Finanças Sustentáveis na Proactiva Consultoria, Dulce Benke, um planejamento sustentável é hoje fator de competitividade. Ela cita a facilidade de acesso a mercados e linhas de financiamentos para aqueles que procuram pelo entendimento, conhecimento, e endereçamento dos riscos e oportunidades socioambientais preconizados pela agenda ESG.

Para dar o primeiro passo rumo a um planejamento socioambiental, entenda quais são aqueles fatores desta agenda que podem impactar o seu negócio  e avalie como você lida com cada um desses fatores. Importante também entender quais são os fatores mais relevantes para seus stakeholders — fornecedores, clientes, acionistas, etc”

Benke ressalta que diversos estudos mostram que uma boa gestão dos recursos naturais (solo, água, economia circular, etc) e de capital humano (colaboradores diretos e indiretos) aumentam a eficiência, a produtividade e o retorno financeiro de qualquer organização.

“É importante ter em mente que a agenda social tem que ter a mesma importância da agenda ambiental na gestão das cooperativas. Gerir a eficiência da sua propriedade no campo é tão relevante quanto gerir a sua relação e seus impactos nas comunidades ao seu entorno”, destaca.


Como mostrar ao mundo que você é sustentável? 

Regularmente, a Global Reporting Iniciative publica normas atualizadas que ajudam instituições públicas e privadas a relatarem publicamente seus impactos mais significativos na economia, no meio ambiente e na vida das pessoas — incluem-se aí questões relacionadas aos direitos humanos, e às maneiras como a organização gerencia esses impactos. Esses indicadores servem como base para a produção de Relatórios de Sustentabilidade — documento criado para demonstrar o compromisso de um empreendimento com o desenvolvimento sustentável de seus negócios. 

Em todo o mundo, organizações que produzem relatórios seguindo os padrões GRI têm um selo de credibilidade no universo empresarial, ganhando reconhecimento também pela relação transparente com seus stakeholders, investidores e clientes, abrindo caminho para novos negócios.

Pesquisa da consultoria KPMG sobre relatórios de sustentabilidade mostrou que, em 2022, quatro em cada cinco grandes organizações adotaram os padrões GRI.  


Esta matéria foi escrita por Janaína Camelo e está publicada na Edição 41 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


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